Visitar Monsanto é sempre, mas sempre, fazer uma viagem no tempo. Fiz essa viagem, mais uma vez, há pouco tempo. Confirmei. Este é um lugar especial. Fica no concelho de Idanha-a-Nova, território raiano e bem próximo da fronteira com Espanha.

Chegar a Monsanto é um momento épico. Para quem vem de carro, no horizonte, independentemente da orientação espacial, começa primeiro por vislumbrar uma pequena montanha, que quase como uma árvore milenar, nasceu sozinha num terreno quase plano. Tem grande destaque, portanto. Com o aproximar, começam-se a distinguir o cinzento da rocha do verde da vegetação, e a pequena montanha começa a ganhar novas formas e novas cores. Mais tarde, mas pouco mais tarde, começam a surgir por entre as rochas, pequenas casas, cuidadosamente alinhadas, quase como se colocassem uma porta e janelas na rochas. Mais perto, distingue-se a Torre do Relógio e o Castelo do Monsanto, que bem no topo da montanha começa a ganhar forma. Nesta altura meus amigos, a vossa viagem começou e é sem volta atrás. Nesta altura, se forem como eu, já a aldeia histórica de Monsanto vos “agarrou”. Começam a imaginar como seria há 500 anos, com as tropas de Castela a tentar conquistar Monsanto, quase como formigas a surgir lá no horizonte. Conseguem ver (na vossa cabeça) os soldados a subir as ruas da aldeia até ao castelo. Conseguem ver reis, rainhas e princesas, duques, cavaleiros e trovadores, ou talvez apenas aventureiros errantes. Todos a chegarem a Monsanto e, talvez como eu, a ficarem deslumbrados com esta aldeia esculpida da rocha. Deixei de ver a silhueta da montanha onde está Monsanto. Passei a ver Monsanto de perto. Entrei na aldeia pelo lado Norte e após uma boa subida estaciono o carro. Na verdade não consigo subir mais. A partir daqui vai ser a pé, tal como os aventureiros errantes de outrora. A viagem não começou aqui, como já vos disse. Começou a uns quilómetros de distância. Mas agora, que entrei na aldeia, existe uma grande diferença. Agora também faço parte do elenco da história.

Tal como já disse, Monsanto fica a pouco mais de 20km da fronteira com Espanha. Se no presente somos hermanos, no passado aplica-se a expressão “nem nos podíamos ver”. Como local a escassa proximidade e pelas características de Monsanto (lugar muito alto, com ampla visão para o horizonte), como devem calcular, era um lugar apetecível. Para ambos os lados. Do lado português, importante por ser uma das primeiras barreiras a impedir os espanhóis de entrar por Portugal adentro. Do lado espanhol o interesse era inverso, seria Monsanto um dos primeiros alvos a abater. Imagino que, no passado, a palavra Monsanto tenha sido muitas vezes enunciada em assuntos militares.

O seu castelo, bem no topo de Monsanto (cerca de 750m de altitude), é o ponto que liga toda a aldeia. É como uma nascente, da qual originou diversos canais. Os canais são as ruas da aldeia. Todas as pequenas e apertadas ruas estão conectadas com o castelo. Uma relação umbilical facilmente perceptível. No passado, todos os caminhos iam “desembocar” no castelo. É a principal razão da aldeia existir. No presente, o castelo, apesar de um rebentamento de pólvora ali armazenada e o desabamento de um penedo, tê-lo deixado meio destruído, ainda restam grande parte dos contornos do castelo. Continua um lugar com grande carácter. E com uma vista deslumbrante, até o horizonte acabar. Facilmente uma pessoa se esquece do tempo por ali. Com uma vista a 360º, tal como uma ilha, é possível observar, em grande escala, tudo o que existe em redor. O Nascer do Sol e o Pôr do Sol, são sempre momentos inesquecíveis por aqui.

Como é óbvio, assim que chego a Monsanto, é largar tudo (neste caso as malas) e subir as ruas das aldeia até ao castelo. É obrigatório. Quase que não me conseguiria concentrar em fazer outra coisa, sem visitar o castelo antes. Estive, nesta viagem, 3 dias em Monsanto. Uma mão não chega para contar as vezes que subi ao castelo. É quase como um vício ou como um íman que nos atrai. Se ver o Sol a ganhar vida é imponente, ver o dia a dar lugar à noite é épico. Não só pelas bonitas cores alaranjadas de um céu sem fronteiras, mas também pela cor das luzes que iluminam as ruas de Monsanto. A aldeia, vista de cima, vista do castelo, ganha forma de uma espécie de presépio gigante e gracioso. Lá está um vício. Ao descrever este momento, só aumenta a minha vontade de seguir para lá. Novamente. 

Na saída do Castelo, a descida, primeiro em jeito de serpente, contornando grandes formas graníticas, e depois afunilando por pequenas ruas, que nos fazem sentir importantes por caminhar pelas suas pedras. É tão gratificante caminhar por ali. Senti-a como um actor num filme de época. Claro que se tinham travado batalhas por ali. Claro que teria de ser um filme de aventuras e conquistas. Mas é um lugar bonito, que é claro que também teria de ter histórias de amor. Um lugar canções, vinho e alegria. Imagino os pequenos cafés e restaurantes da aldeia, como lugares de encontros e desencontros no passado. Imagino cavalos à porta e música a sair pelas janelas, como um chamamento de boas energias para este local, que é cinzento, mas que nem por sombras consegue ser sombrio. Nos dias de hoje, tirando os meses de Verão, é lugar pacato. Apenas interrompido a espaços pela chegada de curiosos turistas. Uns apenas sobem as ruas do castelo. Outros ficam pequenas temporadas, como por exemplo um escritor italiano com quem me cruzei. Estava em busca de inspiração para uma criação templária. Outros acredito que se deixem cair na tentação, e passem de turistas a residentes. É fácil, pelo menos, pensar nessa hipótese. 

Quase tão graciosos como as ruas de Monsanto, são as suas gentes. De sorriso fácil e ligadas à sua terra, é sempre um momento alto, as chamadas conversas de peal, num qualquer final de tarde, de preferência com um clima ameno. Quase todas as casas têm um pequeno banco em granito “colado” à sua porta. Quando não existe o banco, existe sempre um pequeno degrau. São elementos canalizadores de pequenas (grandes) conversas de algibeira, onde se falam dos antigos com um carinho que se mistura com saudade. Com sorte a musica junta-se à conversa. O adufe é o “instrumento oficial” de Monsanto e as pessoas daqui não o usam apenas para decoração. Principalmente as mulheres, gostam muito de cantar uma modinha ao ritmo do som do adufe. Quase a lembrar aquelas velhas canções dos trovadores. Estas também falam de amores e desamores. Também falam de tradições e rotinas. 

Foi com a cores alaranjadas do final do dia que esta minha viagem terminou. Desci as ruas até ao primeiro patamar da aldeia onde o meu carro estava estacionado. Entrei e conduzi em direção a Idanha, para depois voltar para casa. Cerca de 2km depois parei o carro na estrada para voltar a olhar, mais uma vez, para silhueta da pequena montanha de Monsanto. Algo me prende a este a lugar.

Não sei quando, só sei que será em breve. O meu regresso à aldeia histórica de Monsanto. Seguramente, um dos lugares mais bonitos onde já estive.

  

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