Gosto de viajar lentamente. Não gosto de ter um plano definido, mas gosto de saber quando é o fim da viagem. Gosto de viver como os locais, fazer amigos (como dizia quando era pequenino: “fazer amigos de verdade”) e ter tempo. Percebem o que quero dizer com “ter tempo”? Ter tempo para ouvir, para sentir, para saborear. Nem sempre é assim, mas quero acreditar que um dia vai ser, sempre, assim.

Apesar desta lentidão desejada, sobretudo sensorial, a minha cabeça nunca consegue parar. Vivo numa fase de excesso de ideias e vontade das realizar, todas. A lentidão associa-se ao tempo e gostaria de ter mais tempo para fazer tudo. Para fazer tudo bem. Neste momento, de mente inquieta, gostaria de ser lento e saborear cada ideia, cada viagem. Mas não consigo. Utilizando uma linguagem romântica: o meu corpo move-se lentamente pelas ruas da cidade…mas ao mesmo tempo, quero ver todas as ruas. Cada vez mais, gosto de fotografia. Cada vez mais, vejo a fotografia como uma arte. Como algo superior, algo que conta uma história e que nos provoca emoções. Muito mais de que mostrar, simplesmente, um lugar ou uma pessoa. Vejo a minha fotografia como uma extensão do meu olhar. Quero que as minhas fotografias transmitam aquilo que estou a sentir, muito mais do que aquilo que estou a ver. Para isso, preciso de tempo. Preciso que a viagem seja mais lenta. Preciso mais tempo para viver cada lugar e para conhecer as suas pessoas. Talvez para me transformar numa pessoa desse lugar, nem que seja por um breve instante.

 Há uns dias discutia a temática viagens, com particular foco no sub-tema “retorno do investimento do tempo (e dinheiro) a viajar”. Muitos diziam que viajar podia mudar uma vida, que tudo, quase que por magia, poderia mudar para melhor. Eu vou mais pela parte da construção. Acho que viajar e estar exposto a diferentes cenários (e culturas, pessoas, paisagens…), nos ajuda a perceber melhor quem nos somos e consequentemente o que andamos aqui a fazer ou que fazemos melhor por aqui. Não acredito que aconteça com todos aqueles que viajam. E nem acho que, aqueles que vêm a “luz” no acto de viajar, sejam melhores do que aqueles que encaram uma viagem pela viagem (o estar fora do seu cenário habitual). No meu “retorno de investimento”, quando existe uma viagem lenta, existe claramente os fatores memórias e emoções, a serem ativados, tal como a abertura desenfreada de um barragem. Fico mais desperto, fico mais sensível, absorvo mais e de uma forma diferente. Não preciso ir para o outro lado do mundo para isso acontecer. Apenas preciso de ir para um cenário diferente do meu cenário original e estar exposto a algo que em inspire. Achei deslumbrante a primeira vez que viajei, lentamente. Parecia que tinha encontrado o meu caminho, sai dessa viajem com vontade de fazer mil coisas. Hoje, com algumas viagens mais, consigo dosear as doses de inspiração. Consigo antecipar onde vou receber inspiração, onde se vou emocionar e onde vou colecionar boas memórias. Mesmo não sabendo o tema e a fonte direta. O problema, quando descobrimos esta espécie de formula milagrosa, é o tempo. Sempre o tempo, que anda sem parar. Quero viajar lentamente, sempre, quero ser inspirado e também já quero inspirar. As limitações provocam escolhas, e é difícil escolher memórias e inspirações. É difícil escolher a rua onde quero viver, lentamente, uma viagem por um destino diferente.

Gosto de viver lentamente. Ter tempo para ouvir, para sentir, para saborear e para partilhar. Nem sempre é assim, mas quero acreditar que um dia vai ser, sempre, assim.

 


 

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