Cuf – companhia união fabril

 

A história das coisas, não são só números, factos ou conteúdo para livros interessantes. Para pessoas como eu, e acho que somos muitos por aí, é aquilo que nos liga a lugares, seja aqueles que visitamos pela primeira vez, ou aqueles onde nascemos e escolhemos viver. No meu caso, nasci em Abrantes e decidi viver em Abrantes. Cada vez, sinto mais orgulho na minha cidade e na história dela. Passei anos a ouvir e pesquisar histórias sobre reis e rainhas, sobre conquistas e castelos, sobre rios e vales. Agora, um dos assuntos históricos que me faz brilhar o olhar, é o passado industrial e o seu legado, não só o legado edificado, mas também o legado cultural. Comecei por descobrir e ficar completamente fascinado com a história da Metalúrgica Duarte Ferreira, em Tramagal. A história da Companhia União Fabril (CUF), em Alferrarede, outro dos colossos industriais do concelho de Abrantes, é um seguimento natural. Para quem gosta de viajar a fundo, de conhecer o que existe para lá da fachada, uma visita ao antigo complexo industrial da CUF em Alferrarede, é ponto obrigatório para a descoberta do, muito interessante, passado recente do território de Abrantes.

Uma nota muito importante. Este texto não pretende ser um documento histórico, nem eu sou um historiador. Sou um viajante que gosta de ouvir e contar histórias. Portanto, esta será a minha breve viagem pela “passagem” CUF por Abrantes. E reforço o “breve”. Porque é uma história e um legado que tem pano para mangas.

Começo pelo inicio, pelo inicio da CUF. Apesar do nome CUF ainda existir, começando pelos hospitais, agora pertencentes ao Grupo José Mello, descendente de Alfredo Silva, ideólogo da “verdadeira” CUF, pouco tem a ver com a CUF que existiu em Abrantes no séc. XX e que foi uma das maiores empresas portuguesas, talvez, de todos os tempos. Ora bem, a CUF surgiu em 1865, com o objectivo de produção de sabões e óleos vegetais. Em pouco mais de 100 anos (até 1974. Sim, para empresa do estado com o 25 de Abril), tornou-se num império. Que detinha empresas nos mais variados sectores, como: o Banco Totta & Açores, no sector da banca; a Companhia de Seguros Império, no sector dos seguros; a União Fabril do Azoto, no sector químico; a Compal, no sector alimentar; a Efacec, no sector eléctrico; a Sonap (que deu origem à Galp de hoje), no sector dos combustíveis; a Celbi, no sector do papel; a Tabaqueira, no sector do tabaco; a Lisnave, no sector naval; ou a Companhia Nacional de Navegação, no sector dos transportes marítimos. Os nomes que referi, não devem chegar a 1% do total de empresas do grupo. Para terem noção da grandeza deste império, que chegou a dar emprego a mais de 100 mil pessoas, só em solo nacional.

No inicio do séc.XX, ainda sem dar passos para um império multidisciplinar, a CUF, para além de Lisboa, também tinha fábricas no Barreiro, Soure, Canas de Senhorim, Mirandela e…Alferrarede. Bem, a relação da CUF com Alferrarede começou com a compra de uma fábrica de azeite que ali existia. A CUF continuou com a extração de azeite, para mais tarde instalar ali a União Fabril do Azoto, ligada ao sector químico, talvez a face mais conhecida da fábrica de Alferrarede, tanto que ainda hoje é mais conhecida como Quimigal, penso que será uma derivação da União Fabril do Azoto, mais do que como CUF.

Um ponto muito interessante na estratégia e linha de pensamento empresarial da CUF, era o bem estar dos seus funcionários. Penso que não era feito em exclusivo da CUF, era uma linha muito marcante na época, mesmo a Metalúrgica Duarte Ferreira, de uma dimensão diferente, seguia esse “condigo de conduta”. Exista uma espécie de protecção por parte da empresa, e mais do fazer parte de uma empresa, seria fazer parte de uma família. Portanto, mais do que a simples instalação da fábrica da empresa em Alferrarede, construíram-se bairros, escolas e espaços de lazer, o clube de futebol, “Os Dragões de Alferrarede” era apoiado pela empresa (o campo ainda hoje tem o nome de CUF), e em outras localidades associadas à CUF, até hospitais se construíram para servir os trabalhadores. Portanto, pertencer aos quadros da empresa, seria muito mais do receber um ordenado no final do mês. Quando em cima referi que além do legado edificado, existia um marcante legado cultural, era disto que estava falar. O bairro da CUF ainda hoje existe, com vista para as antigas instalações da fábrica. Adoro os nomes das ruas do bairro. Azoto, Amoníaco e Hidrogénio. Também existia nos terrenos entre um bairro e a fabrica, aquilo que penso que terá sido um imenso espaço de lazer. Pelo menos, duas piscinas tinha. Hoje consumidas pela natureza. Ao passar, nos dias de hoje pelas ruas do bairro, é sempre fazer uma viagem no tempo. Quase como recuar 100 anos atrás e imaginar como seria. Não com espirito saudosista tipicamente português “naquele tempo é que era bom”, mas mais ao estilo de orgulho no passado da minha terra. Imagino os trabalhadores a caminhar para a fabrica, os seus filhos a caminhar para a escola, que fica na rua em frente ao bairro, e todos juntos, ao fim de semana, irem ver o futebol ao campo da CUF, também bem pertinho dali. Sempre ouvi falar dos grandes jogadores que passaram por ali. Muitos trabalhavam nas fabricas do Barreiro e Lisboa, e jogavam no clube original da CUF, um dos mais fortes de Portugal nos meados do séc. XX, chegaram a jogar nas competições europeias e até o poderoso Milão veio jogar contra a CUF ao Barreiro. Na fase final da carreira, mas com uma qualidade acima da média, faziam a viagem do clube do Barreiro, para os “Dragões de Alferrarede”. Depois ficariam a trabalhar na fábrica. Talvez ainda hoje existiam famílias de ex-jogadores por ali.

Não encontrei uma data em especifico para o fecho da fábrica de Alferrarede. Assumo que, com a nacionalização da empresa em 1974, e com toda uma mudança do grupo, pouco mais durou depois dessa data. Nos dias de hoje, o bairro ainda existe, assim com o edifício da escola, embora sem qualquer utilização prática. Uma parte das instalações da fabrica foi adquirida pelo município de Abrantes, para instalar aí um parque tecnológico, ligado à inovação e investigação. Hoje estão aí sediados, o Tagus Valley ou as salas de aula da Escola Superior de Tecnologia de Abrantes, entre outras empresas que lá exploraram os seus mundos. Penso que é uma bonita adaptação dos tempos, que honra o seu passado marcante e também inventivo. A estação de comboios de Alferrarede, divide as instalações da fábrica. No passado era fácil de perceber a sua utilização e ainda hoje são visíveis os carris a ligar a estação a pavilhões e sectores da fábrica. Hoje a estação divide o espaço público e privado daquilo que foi a fábrica da CUF em Alferrarede. Do lado Sul da estação, os edifícios estão devolutos e à espera de nova vida. Espero que seja áurea e que honre o que por lá se viveu.

Para terminar, outra coisa muito engraçada que descobri. Existiu um navio chamado Alferrarede, com quase 75 metros de comprimento. Sim, claro que pertencia à CUF. Percorreu muitos mares, li que eram frequentes as viagens até à Terra Nova (Canadá) e andou metido em “brigas” na 2ª Guerra Mundial. Bonita homenagem a Alferrarede.

Mais uma vez, muito orgulho na minha santa terra.

 

A história das coisas, não são só números, factos ou conteúdo para livros interessantes. Para pessoas como eu, e acho que somos muitos por aí, é aquilo que nos liga a lugares, seja aqueles que visitamos pela primeira vez, ou aqueles onde nascemos e escolhemos viver. No meu caso, nasci em Abrantes e decidi viver em Abrantes. Cada vez, sinto mais orgulho na minha cidade e na história dela. Passei anos a ouvir e pesquisar histórias sobre reis e rainhas, sobre conquistas e castelos, sobre rios e vales. Agora, um dos assuntos históricos que me faz brilhar o olhar, é o passado industrial e o seu legado, não só o legado edificado, mas também o legado cultural. Comecei por descobrir e ficar completamente fascinado com a história da Metalúrgica Duarte Ferreira, em Tramagal. A história da Companhia União Fabril (CUF), em Alferrarede, outro dos colossos industriais do concelho de Abrantes, é um seguimento natural. Para quem gosta de viajar a fundo, de conhecer o que existe para lá da fachada, uma visita ao antigo complexo industrial da CUF em Alferrarede, é ponto obrigatório para a descoberta do, muito interessante, passado recente do território de Abrantes.

Uma nota muito importante. Este texto não pretende ser um documento histórico, nem eu sou um historiador. Sou um viajante que gosta de ouvir e contar histórias. Portanto, esta será a minha breve viagem pela “passagem” CUF por Abrantes. E reforço o “breve”. Porque é uma história e um legado que tem pano para mangas.

Começo pelo inicio, pelo inicio da CUF. Apesar do nome CUF ainda existir, começando pelos hospitais, agora pertencentes ao Grupo José Mello, descendente de Alfredo Silva, ideólogo da “verdadeira” CUF, pouco tem a ver com a CUF que existiu em Abrantes no séc. XX e que foi uma das maiores empresas portuguesas, talvez, de todos os tempos. Ora bem, a CUF surgiu em 1865, com o objectivo de produção de sabões e óleos vegetais. Em pouco mais de 100 anos (até 1974. Sim, para empresa do estado com o 25 de Abril), tornou-se num império. Que detinha empresas nos mais variados sectores, como: o Banco Totta & Açores, no sector da banca; a Companhia de Seguros Império, no sector dos seguros; a União Fabril do Azoto, no sector químico; a Compal, no sector alimentar; a Efacec, no sector eléctrico; a Sonap (que deu origem à Galp de hoje), no sector dos combustíveis; a Celbi, no sector do papel; a Tabaqueira, no sector do tabaco; a Lisnave, no sector naval; ou a Companhia Nacional de Navegação, no sector dos transportes marítimos. Os nomes que referi, não devem chegar a 1% do total de empresas do grupo. Para terem noção da grandeza deste império, que chegou a dar emprego a mais de 100 mil pessoas, só em solo nacional.

No inicio do séc.XX, ainda sem dar passos para um império multidisciplinar, a CUF, para além de Lisboa, também tinha fábricas no Barreiro, Soure, Canas de Senhorim, Mirandela e…Alferrarede. Bem, a relação da CUF com Alferrarede começou com a compra de uma fábrica de azeite que ali existia. A CUF continuou com a extração de azeite, para mais tarde instalar ali a União Fabril do Azoto, ligada ao sector químico, talvez a face mais conhecida da fábrica de Alferrarede, tanto que ainda hoje é mais conhecida como Quimigal, penso que será uma derivação da União Fabril do Azoto, mais do que como CUF.

Um ponto muito interessante na estratégia e linha de pensamento empresarial da CUF, era o bem estar dos seus funcionários. Penso que não era feito em exclusivo da CUF, era uma linha muito marcante na época, mesmo a Metalúrgica Duarte Ferreira, de uma dimensão diferente, seguia esse “condigo de conduta”. Exista uma espécie de protecção por parte da empresa, e mais do fazer parte de uma empresa, seria fazer parte de uma família. Portanto, mais do que a simples instalação da fábrica da empresa em Alferrarede, construíram-se bairros, escolas e espaços de lazer, o clube de futebol, “Os Dragões de Alferrarede” era apoiado pela empresa (o campo ainda hoje tem o nome de CUF), e em outras localidades associadas à CUF, até hospitais se construíram para servir os trabalhadores. Portanto, pertencer aos quadros da empresa, seria muito mais do receber um ordenado no final do mês. Quando em cima referi que além do legado edificado, existia um marcante legado cultural, era disto que estava falar. O bairro da CUF ainda hoje existe, com vista para as antigas instalações da fábrica. Adoro os nomes das ruas do bairro. Azoto, Amoníaco e Hidrogénio. Também existia nos terrenos entre um bairro e a fabrica, aquilo que penso que terá sido um imenso espaço de lazer. Pelo menos, duas piscinas tinha. Hoje consumidas pela natureza. Ao passar, nos dias de hoje pelas ruas do bairro, é sempre fazer uma viagem no tempo. Quase como recuar 100 anos atrás e imaginar como seria. Não com espirito saudosista tipicamente português “naquele tempo é que era bom”, mas mais ao estilo de orgulho no passado da minha terra. Imagino os trabalhadores a caminhar para a fabrica, os seus filhos a caminhar para a escola, que fica na rua em frente ao bairro, e todos juntos, ao fim de semana, irem ver o futebol ao campo da CUF, também bem pertinho dali. Sempre ouvi falar dos grandes jogadores que passaram por ali. Muitos trabalhavam nas fabricas do Barreiro e Lisboa, e jogavam no clube original da CUF, um dos mais fortes de Portugal nos meados do séc. XX, chegaram a jogar nas competições europeias e até o poderoso Milão veio jogar contra a CUF ao Barreiro. Na fase final da carreira, mas com uma qualidade acima da média, faziam a viagem do clube do Barreiro, para os “Dragões de Alferrarede”. Depois ficariam a trabalhar na fábrica. Talvez ainda hoje existiam famílias de ex-jogadores por ali.

Não encontrei uma data em especifico para o fecho da fábrica de Alferrarede. Assumo que, com a nacionalização da empresa em 1974, e com toda uma mudança do grupo, pouco mais durou depois dessa data. Nos dias de hoje, o bairro ainda existe, assim com o edifício da escola, embora sem qualquer utilização prática. Uma parte das instalações da fabrica foi adquirida pelo município de Abrantes, para instalar aí um parque tecnológico, ligado à inovação e investigação. Hoje estão aí sediados, o Tagus Valley ou as salas de aula da Escola Superior de Tecnologia de Abrantes, entre outras empresas que lá exploraram os seus mundos. Penso que é uma bonita adaptação dos tempos, que honra o seu passado marcante e também inventivo. A estação de comboios de Alferrarede, divide as instalações da fábrica. No passado era fácil de perceber a sua utilização e ainda hoje são visíveis os carris a ligar a estação a pavilhões e sectores da fábrica. Hoje a estação divide o espaço público e privado daquilo que foi a fábrica da CUF em Alferrarede. Do lado Sul da estação, os edifícios estão devolutos e à espera de nova vida. Espero que seja áurea e que honre o que por lá se viveu.

Para terminar, outra coisa muito engraçada que descobri. Existiu um navio chamado Alferrarede, com quase 75 metros de comprimento. Sim, claro que pertencia à CUF. Percorreu muitos mares, li que eram frequentes as viagens até à Terra Nova (Canadá) e andou metido em “brigas” na 2ª Guerra Mundial. Bonita homenagem a Alferrarede.

Mais uma vez, muito orgulho na minha santa terra.

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